segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Dasein


Gosto quando não te vejo
pois é nesta hora
que você parece não existir.
Mas, quando chegas assim
altivo, soberbo, suficientemente
solitário e belo,
meu peito vazio
parece palpitar.

Lágrimas indesejadas
brotam dos meus olhos
e parece faltar tudo em mim
porque te vejo.

Posso sentir suas mãos,
ouvir sua respiração,
o barulho do seu all star novo
pisando impaciente
contra o chão.

Mas você não me vê
Olha e simplesmente finge
que eu não existo.
E não o culpo por isto.

Mas estou cansada
de fingir que você
não existe.

Fingir que não te amo,
que não penso em você
constantemente.

E me contento
com essa sua tosse abafada
assistindo alguma
filosofia heideggeriana,
concentrado,
bem disposto e muito perto.

Entretanto, inalcançável
para meus abraços e afagos
e cruelmente surdo
a minha voz.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

O Ente e a Essência


O que aprecio em você
não são simplesmente seus olhos
ou a cor que eles possuem
quando refletem a luz do Sol.
O que eu amo
é a forma como você me olha
desvendando cada parte do meu ser.

O que aprecio em você
não é apenas o formato da sua boca
ou o jeito como você me beija,
são as palavras doces e reconfortantes
que somente sua voz
consegue musicalizar.

O que aprecio em você
não é apenas o balançar do seu corpo
indo e vindo desleixado
É a forma como tudo ao redor
parece incandescer de paixão e alegria
no exato momento em que você chega.

O que aprecio em você
não é apenas seu cérebro formidável
é a forma como você o usa,
com sensibilidade e empatia
capaz de dar sentimentos
a uma simples pedra fria.

E no fim
eu acabo apreciando
tanto tudo em você
que me faltam palavras
sons
ou
músicas
capazes de expressar
exatamente o que você me faz sentir
ou perceber.

E eu acabo
paralizada no meu silêncio
olhando, apreciando e admirando
tudo que existe somente em você.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

"November Rain"


E embalada
nessa chuva quente de novembro
deixo minhas lembranças escorrerem
como se desfizessem
aos poucos
todo mal que lhe causei
e que você me causou.

Agora você está livre
de todo caos
que sempre representei
pra você.
A calmaria pode fincar
raízes no seu manso
jeito de ser.

E fico feliz por isso.

Por ver escorrer a chuva
pela janela do ônibus
imaginando quantas
lágrimas despencaram
por sua causa, como
essa chata chuva quente de novembro.

Mas que como uma simples chuva
ela se dissipa
para que chegue
um belo Sol aconchegante
que vai secar
cada gota
entristecida e machucada
que porventura
teimou em cair.

E a chuva que parecia
doce e mansa
agora mostra-se
chata e impertinente.

Mas que como qualquer
outra chuva
ela simplesmente
termina.

sábado, 14 de novembro de 2009

Silencia


Assim termina o dia
com sua ausência calculada
sob esta chuva fina
e quente de novembro
contornando a janela fechada

suas palavras ecoam dramáticas
como o último suspiro mudo
de uma pequena
e frágil flor
prestes a ser arrancada
de um precipício
seguro e acolhedor

aqueço meu coração
esperando aquele exato momento
em que você vai me dizer
tudo aquilo que não consegue
dizer
nem pra você mesmo
nem pra mim
nem mesmo por você


e temo por isso

por toda essa mácula de sensações
reprimidas
contidas
mantidas
secretamente no seu eu mais recôndito.


e temo por isso

porque sei que todo esse
improvável devir descrente
consome seus melhores pensamentos
suas inspirações
sua poesia
seu amor
seu ânimo


e temo por isso

por não fazer parte
dessa sua alucinação
ou por nela estar presente
de forma ausente

e temo
por não tê-lo em minhas mãos
ou em meus braços
e abraços
quando você mais precisa deles
pra voltar pra mim

e então eu espero
como essa mesma flor
ansiosamente
por suas palavras
desabafadas
desabadas
desesperadas
e mormente
silenciadas.


que teimam
constantemente
em não sair.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Inocência


Seus olhos desvelam o meu ser
Como se me perguntassem a todo tempo
Como fui capaz de merecer
Tamanho ardor de sentimento.

Desejei dominá-lo, amá-lo, encontrá-lo,
Fiz-me protetora, paciente e voluntariosa
Preferi não ser eu mesma, para não assustá-lo
E pequei muitas vezes, fingindo ser audaciosa.

Sou uma criança, uns dez anos mais nova
Ainda que não pareça, ainda que eu tema
Sinto que posso ser aquela solitária rosa
Do asteróide B-612 e inventei você, desde pequena.

Meu talismã, minha estrela, meu universo
Meu dia, meu mar, meu sol, minha sorte
Meu anjo, minha inspiração, meu verso
Meu sonho, minha realidade, meu norte.

E antes que eu me deite e a noite desapareça
E que o dia o leve de mim, deixando tristeza
Lembre-se de mim, ainda que eu não mereça.
A saudade dói, embora eu finja que esqueça.

domingo, 25 de outubro de 2009

O que de mim ainda resta


Você que tantas vezes bebeu meu gozo
Que viu meu peito arfar de tanto ardor
Que roubou-me o ar com sua boca
Devorando-me até a última gota de amor.

Agora, mostra-se como uma cabeça oca
Sem lembrança, jogada na existência com pavor
Amarre meu pescoço, condene-me a forca
Só não me deixe existir, morrendo de dor.

Volte para os meus braços, Bela reluzente
Ilumine a minha vida, com esse ar contente
Roube essa alma, deste corpo já ausente.

Beije-me como se ainda me amasse
Engane-me, como se ainda restasse
Um pouco de mim na sua mente.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

A noite


Oh! Noite interminável,
quente, salgada, incômoda
Tira esse meu rosto amável
E afogue-o numa onda.

Mostre-me, oh! Noite longa
De uma vez, sem demora
A minha verdadeira face
Aquela que eu fui, outrora.

Oh! Noite cruel,
Traga-me a doce aurora
E reflita neste céu
a máscara que tenho agora.

Diga-me a verdade,
Oh! Noite sofrida
Desvele minha maldade
e a bondade fingida.

Oh! Noite escura,
esconda qualquer ternura
que exista em minha vida.

Traga um furacão,
entorpeça-me de paixão
cure-me desta ferida.

Livre o meu passado
daquela sensação oprimida
dê-me a liberdade
aquela que foi perdida

Deixe-me amar de verdade
aquele que por pura maldade
trouxe-me de volta a vida.

sábado, 17 de outubro de 2009

"Dor na existência"


Certa vez, pintei pra você
Pus minha alma ali
Uma vida inteira
Como se com esse gesto,
este singelo gesto cansativo,
eu pudesse salvá-lo de todas as dores do mundo.
Inclusive a da existência.
E talvez eu tenha dado vida a você.
Afinal,
Você só começou a existir pra mim
No exato momento em que meus olhos desejaram os seus
e tudo que havia em você,
tudo que há e existe,
tudo que foi e que nunca será.

Dentre todos os entes
que eu desejei dar existência
Você foi o melhor dos meus desejos
De tudo que há e existe
De tudo que foi e que ainda será.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

O amado



Sua presença foi notada pela primeira vez num dia frio de primavera. Naquele bosque regado de vida, sua seriedade parecia se impor sobre todas as outras coisas. O mundo seria dele mais cedo ou mais tarde. E ela não estaria ali para assisti-lo.

A fé lhe transbordava pelos poros. Causava temor aproximar-se de alguém tão rigoroso consigo mesmo e com os outros; tão admiralvemente moral e justo. Jamais lhe alcançariam o padrão de ser. Mas, aos poucos ela foi tomando-lhe o tempo, a mente, o corpo. E por fim, aquele coração que supusera amar tantas vezes, descobrira uma curiosa paixão. Talvez um pouco descontrolada; um pathos irascível, possessivo, ciumento e por fim, agressivo.

E aqueles lábios desejaram o álcool e a nicotina para suprir a falta de outros lábios. A mente precisava ocupar-se com livros, blogs, artigos e filosofias. Seu psicanalista confundia-se com os extremos e a sua amante desistia desse amor. Desistia do mundo reconstruido na sua mente, só para sentir esse arrebatamento mais uma vez.

Desconhecia a nova forma daquele rapaz intelectual, aromatizado com as essências dos grandes campos. Era incapaz de nomeá-lo, e por fim, ela desejava o antigo rapaz dos bosques. Este novo acostumara-se a cidade grande, ao trabalho na tv e aos forrós de quinta a noite. Tornara-se mais um na multidão de homens comuns. Mas, mesmo assim o amava, ainda que ele gritasse, chingasse ou pensasse que no fundo, era a amante quem tinha mudado e não ele próprio: o amado.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

O dragão dourado


Um dia resolveram que eu estudaria Direito. Isso deve fazer uns cinco anos no próxmo inverno. Não que isso faça muita diferença, mas só agora me dei conta de que uma das coisas mais importantes e mais estranhas da minha vida aconteceu na faculdade. Ainda bem que escolheram por mim.

Acontece que no primeiro dia, o fatídico dia em que eu realmente daria alguns dedos para não estar ali, tive uma visão; porque, obviamente, aquilo não poderia ser real. Minha mente não seria criativa a ponto de inventar algo como um dragão dourado belo e reluzente olhando pra mim, falando comigo e puxando uma suave discussão envolvendo economia, Marx e provavelmente suas tentativas de salvar o mundo.

Aquilo me perturbou durante semanas. Mas, os outros pareciam não se dar conta daquele enorme dragão soltando fumaça e jogando seu charme pra meninas indefesas. Eu estava enlouquecendo. Sempre gostei de dragões. E ter um assim, do seu lado, faz sua respiração falhar por alguns segundos.

Então, o dragão arrumou uma namorada. Ela era da turma. Eles eram lindos. Mas os dragões são meio azarados no amor como pude perceber mais tarde. E ele se tornou meu amigo. O melhor, o mais forte, o mais belo, o mais cativante, o mais engraçado e bom.

Ele me aconselhava em algumas noites frias. Vinha do reino dos dragões voando suave pra me levar ao cinema. (Ele gostava muito de desenhos 3D). Ria das minhas bebedeiras e de vez em quando esboçava um pseudo-ciúme infantil. E eu o amava, com tudo que se pode amar o dragão mais leal, justo, honesto e belo que existe. Ainda que na minha mente ele pareça uma saudável alucinação. Eu não ligo. Ele será sempre meu dragão.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Com Tolkien, para Beren


Nos encontramos na Terra-Média. Ele levava seu cachimbo e eu escondia alguns Dragões e Balrogs no fundo da bolsa. Falava enrolado, como alguém que tem muito a dizer mas que não consegue expressar. No entanto, em meio a ironias sutis, quase divertidas, sua expressão era mais severa que a de um pastor presbiteriano calvinista predestinado a salvação.

Discutimos a magnitude do brilho das Silmarills e invocamos alguns Ents para uma companhia tranquila. Vimos Mithrandir provocar alguns Hobbits e caminhamos a esmo pelas florestas encantadas parando apenas para discutir a natureza de todos os desentendimentos entre elfos e anões. E depois de muito debate, concluimos que o mundo foi realmente tecido por uma melodia quase inaudível.

Por fim, perguntei sobre Lúthien; e o silêncio agressivo dos seus olhos me sugou para seu próprio abismo. O homem animado e quase infantil, tornara-se sorumbático. E como num filme, conforme contava a sua história pude ver a minha própria entrelaçando-se a dos nossos personagens favoritos. Eram três estórias de amor. Uma marcada pela separação oriunda da Guerra, outra pela morte, e a minha pelas coincidências. E hoje eu compreendo. Não passam de boas estórias, dessas que rendem poesias, cartas, fotos e algumas lágrimas.