quarta-feira, 14 de outubro de 2009

O amado



Sua presença foi notada pela primeira vez num dia frio de primavera. Naquele bosque regado de vida, sua seriedade parecia se impor sobre todas as outras coisas. O mundo seria dele mais cedo ou mais tarde. E ela não estaria ali para assisti-lo.

A fé lhe transbordava pelos poros. Causava temor aproximar-se de alguém tão rigoroso consigo mesmo e com os outros; tão admiralvemente moral e justo. Jamais lhe alcançariam o padrão de ser. Mas, aos poucos ela foi tomando-lhe o tempo, a mente, o corpo. E por fim, aquele coração que supusera amar tantas vezes, descobrira uma curiosa paixão. Talvez um pouco descontrolada; um pathos irascível, possessivo, ciumento e por fim, agressivo.

E aqueles lábios desejaram o álcool e a nicotina para suprir a falta de outros lábios. A mente precisava ocupar-se com livros, blogs, artigos e filosofias. Seu psicanalista confundia-se com os extremos e a sua amante desistia desse amor. Desistia do mundo reconstruido na sua mente, só para sentir esse arrebatamento mais uma vez.

Desconhecia a nova forma daquele rapaz intelectual, aromatizado com as essências dos grandes campos. Era incapaz de nomeá-lo, e por fim, ela desejava o antigo rapaz dos bosques. Este novo acostumara-se a cidade grande, ao trabalho na tv e aos forrós de quinta a noite. Tornara-se mais um na multidão de homens comuns. Mas, mesmo assim o amava, ainda que ele gritasse, chingasse ou pensasse que no fundo, era a amante quem tinha mudado e não ele próprio: o amado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário